Eu sou bem novo na tradição reformada e ainda estou juntando todas as peças, especialmente quando se trata das questões espinhosas da eleição e da soberania. De certa maneira, sou um calvinista relutante; ainda prefiro palavras como “mais ou menos reformado” para descrever a mim mesmo; porque me identifico sim com a tradição em geral, mas também por causa da lentidão com que tenho sido atraído. Sendo assim, ainda me lembro de como é achar o calvinismo e os calvinistas completamente irritantes.
Havia diferentes razões para essa desconfiança.
Três Homens em Conflito
Primeiro, havia as razões tolas como orgulho pessoal e ignorância. É triste dizer que quando se tratava de calvinismo, eu pensava que sabia exatamente do que estava falando e o que estava rejeitando, sem de fato estar familiarizado com a tradição. Houve um tempo em que eu era um anticalvinista instintivo que zombava toda vez que o reformador genebrês era sequer mencionado, tudo sem ter aberto uma página das Institutas. Ah, a ironia.
Depois havia o que eu chamava de boas razões: objeções de boa-fé que repousavam em perguntas legítimas da filosofia, da doutrina de Deus e de sã exegese bíblica. Essas são razões com as quais eu ainda luto, razões pelas quais oro, razões que eu penso que podem sempre estar no fundo da minha mente. O que você faz com toda a linguagem bíblica sugerindo escolha legítima? O que significa “amor” se é uma conclusão pré-existente? Ou como Deus pode ser verdadeiramente todo-benevolente se seu amor salvífico é exclusivo para os “eleitos”? E como é justo que alguém nascido em pecado, sem esperança de se voltar para Deus por si mesmo, seja condenado por uma escolha que nunca foi, de fato, dada a ele? Então o Deus que “ordena todas as coisas” é o autor do mal?
Claro, eu sei que há objeções em conceber essas perguntas dessa maneira (objeções que agora compartilho). Mas ainda são boas perguntas à primeira vista que outros cristãos que leem a Bíblia, amam a Jesus e odeiam o pecado lutam para entender — e frequentemente as respondem diferentemente por razões sãs, piedosas e inteligentes. O fato é que muito da teologia reformada é contra intuitivo e difícil de abraçar de primeira, especialmente para aqueles de nós que foram criados no ocidente moderno.
Alguns de vocês podem estar se perguntando: “Por que se dar ao trabalho de falar disso? Isso é óbvio. Quem questionaria isso?” Sejamos honestos: muitos calvinistas não admitem essa dificuldade, e isso vem da maneira condescendente, agressiva, desagradável e que em nada ajuda que eles discutem teologia com pessoas de quem discordam. Você sabe do que estou falando. Você os encontra nos estudos bíblicos, seções de comentários de blogs, igrejas reformadas insulares que ninguém visita; o arquetípico novato que apresenta repetições remendadas de doutrinas reformadas, como se elas fossem as mais óbvias verdades de Deus que apenas um tolo perversamente obstinado não perceberia; o especialista irritadiço que acrescenta condescendência e sarcasmo somente o suficiente para contradizer toda a sua fala a respeito da graça. (“Apenas assista este sermão em Romanos 9 e você vai me agradecer por te mostrar o quão burro você é”).
Essa foi minha razão final para me irritar com o calvinismo: calvinistas realmente arrogantes, cabeças-duras, (frequentemente jovens) sabe-tudo e sarcásticos. Quem quer ser plantado em um solo que produz tais frutos? A longo prazo, essa não é a melhor razão para rejeitar uma doutrina, assim como outra versão da comum objeção ateísta: “Se o cristianismo fosse verdade, então os cristãos deveriam ser ótimos, mas todos os cristãos que eu conheço são uns babacas, então o cristianismo deve ser falso” (vide C.S. Lewis em Cristianismo Puro e Simples). Ainda assim, ainda há algo a considerar dada a declaração do próprio Cristo de que as pessoas são conhecidas por seus frutos.
Um Apelo à Útil Humildade
Estou fazendo um apelo retórico aos meus irmãos e irmãs reformados por paciência (ou uma “útil humildade”) para com aqueles que não abraçam os distintivos da teologia reformada, o calvinismo, e àqueles de nós para com aqueles que abraçam.
Como eu disse, eu abracei muito lentamente a tradição reformada. Levou anos de leitura de diferentes textos, trabalhando questões pesadas de metafísica, pensando profundamente através das implicações da distinção entre Criador e criatura, e chegando a apreciar a tradição reformada além de sua soteriologia. Eu fui trazido à sua mais rica tradição de espiritualidade através de uma apreciação de sua ênfase em uma constelação de doutrinas bíblicas como a revelação, a união com Cristo, a providência, a expiação e a Ceia do Senhor, que formam o contexto apropriado para seu ensino sobre a eleição.
Contudo, esse processo não aconteceu em um vácuo. Dois amigos pacientes incorporaram a útil humildade para comigo conforme eu passava pelas questões. Eles eram prontos a celebrar as verdades as quais compartilhávamos. Eles argumentavam graciosamente comigo nos momentos certos, mas nunca questionaram minha fé ou minha inteligência. Eles me apontavam bons recursos e eram dispostos a ler alguns que eu apontava a eles. Essencialmente, eles se preocupavam em ouvir e entender meus problemas conforme discutíamos. Mais do que isso, eles honestamente tentaram estender a livre graça que eles criam ter recebido de Deus sem nenhum mérito deles mesmos.
Por favor, não entenda este artigo como um chamado a abandonar a discussão teológica ou a clara pregação da verdade — mesmo dos pontos distintivos — ou a uma espécie de cristianismo molenga de menor denominador comum. É simplesmente um lembrete de que, sim, muitas dessas coisas são estranhas e contraintuitivas no início, então devemos ser compreensivos, especialmente se queremos ser ouvidos.
Deixe-me colocar da seguinte maneira: se você é realmente um calvinista e crê que você recebeu o conhecimento da verdade pela absoluta graça de Deus, que é o que ensina a visão reformada de conhecimento, então seja paciente com aqueles que não veem da mesma maneira. Deus foi (e continua sendo) paciente com você em alguma área também. Então pare de ser sarcástico e peça a Deus para torná-lo humilde o suficiente para ser útil para com aqueles ofendidos por (ou que lutam para entender) aquelas doutrinas que você agora preza.
Derek Rishmawy é o diretor do ministério de universitários e jovens adultos na Trinity United Presbyterian Church em Orange County, Califórnia, onde disputa jovens universitários para Cristo. Ele recebeu seu bacharelado em filosofia na Universidade da Califórnia, Irvine, e seu mestrado em estudos teológicos na Azusa Pacific University.
O blog do Derek é o Reformedish. Você pode segui-lo no Twitter.
Tradução: Alan Cristie
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Derek Rishmawy é o ministro do campus da Reformed University Fellowship (RUF), na University of California Irvine, EUA e é candidato ao doutorado na Trinity Evangelical Divinity School. Ele escreve uma coluna para Christianity Today e lidera conjuntamente o podcast Mere Fidelity. Pode-se segui-lo no Twitter ou ler mais em seu blog, Reformedish.
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